O Engenheiro
A luz, o sol, o ar livre
envolvem o sonho do engenheiro.
O engenheiro sonha coisas claras:
Superfícies, tênis, um copo de água.
O lápis, o esquadro, o papel;
o desenho, o projeto, o número:
o engenheiro pensa o mundo justo,
mundo que nenhum véu encobre.
Em certas tardes nós subíamos
Ao edifício. A cidade diária,
Como um jornal que todos liam,
ganhava um pulmão de cimento e vidro.)
Como um jornal que todos liam.
A água, o vento, a claridade,
de um lado o rio, no alto as nuvens,
situavam na natureza o edifício
crescendo de suas forças simples.
João Cabral de Melo Neto
Como eu poderia estabelecer uma relação entre um homem concreto e o poema de João Cabral? Ja descobri! o título e as características comuns a ambos. Pois quando vejo o poema em minha frente, ganha tamanho o homem carne, músculos, pelos e solidão.
Nada sei sobre ele, ou quase nada, contudo, posso criar, avolumar, como faço com a semântica do poema na sua linguagem, racional, concreta e automática da razão. Embora seja carinhoso, suas ações não dão margem à inspiração e à poesia. Talvez, porque não tenha conseguido abrir espaço entre a geometrização e a exatidão, para deixar nascer o sonho e a subjetividade, tão meus.
Somos dois opostos.
Enquanto vejo a beleza da vida de dentro do pulmão de cimento e vidro, ele prefere medir e calcular a construção do pulmão;
Enquanto vejo a perspicácia, astúcia do olhar e penso sobre o que há por trás de tudo, ele prefere o automatismo visual concreto e instantâneo.
O que eu queria mesmo era lhe descobrir. Do mesmo modo em que o eu lírico do engenheiro lia a cidade diária ao ganhar aquele pulmão.
Mas o bom de tudo isso, seria que eu saisse do poema, esquecesse a poesia que está enraizada em mim e fosse em busca de sua objetividade, tocasse, medisse e construísse um edifício sem portas e sem janelas fechando-o para evitar que de mim se fosse.
Impossível!!!Os contrários se repelem. Entretanto, bem que a adversidade deveria transformar-se em adição e nesse sentido, você ganharia e eu mais uma vez pela dominação ... não!
A relação foi estabelecida. E, com tal maestria, que chego a duvidar de que o engenheiro e o poema não sejam a mesma coisa.